Por Maria Fernanda Seixas e Rafael Campos para a Revista do Correio
Liberdade, liberdade... Jovens contam o quão difícil e necessária é a decisão de revelar para a família a homossexualidade. Sair do armário, porém, é uma atitude libertadora. Hoje, os pais também encontram apoio para aceitar a escolha do filho
A história se repete todos os dias, com personagens diferentes. O garoto era um bom aluno, tirava boas notas e entrou para a faculdade. Sempre foi um filho carinhoso e prestativo, mesmo que na adolescência tenha parecido um tanto tímido e fechado com os familiares. Cheio de saúde e muito bem educado, recebeu todo tipo de estímulos culturais e afetivos dentro de casa. Até que um dia assumiu para os pais que é homossexual. E todas as virtudes desapareceram por um momento: “Onde foi que nós erramos?” Para a psicóloga Edith Modesto, que viveu essa exata situação 20 anos atrás, quando o filho caçula se assumiu gay, a sensação foi de revolta — consigo mesma, com Deus, com o destino. “Questionava o tempo inteiro por que eu? Por que meu filho? Parecia um castigo.”
Toda história, porém, tem dois lados. O(a) garoto(a) amava os pais, mas vive um constante conflito interno. Sente-se diferente desde criança e isso lhe trazia uma sensação de isolamento. Aos poucos, percebe que sua orientação sexual é diferente da esperada pela sociedade e pela família. E, a partir desse dia, começa sua guerra privada de autoaceitação. Aceitar quem é, que sua escolha não era uma opção e que, inevitavelmente, traz sofrimento para quem ama. Isso até tomar coragem de se assumir para a família. “O que será da minha vida agora?” Foi assim com o relações públicas Gustavo Freitas, 23 anos. Todas as noites, remoía o momento em que contaria para a família sobre sua orientação sexual. Foram madrugadas insones, permeadas por dilacerantes pensamentos de medo e angústia. Numa discussão, ele finalmente revelou seu segredo. Passado o turbilhão de questionamentos — mais especificamente quatro longos anos —, mãe e filho, hoje, trocam confidências sobre seus relacionamentos com bom humor.
Ao mesmo tempo em que o ato de “sair do armário” parece uma atitude de libertação, de abraçar uma nova vida livre de mentiras, significa também ter que lidar com a aceitação do outro. De saber que, ao menos por uma fase, ser homossexual parecerá maior do que ser todas as outras coisas: profissional, honesto, responsável. Não há momento certo. Hoje, jovens recém-egressos da infância já têm coragem de declarar a preferência sexual. Mas ainda há uma grande quantidade deles que imagina uma vida eternamente presa em uma gaiola. Os que se libertam, porém, garantem que nenhuma dificuldade supera o prazer de ser verdadeiro consigo e com os outros. E são essas as histórias que a Revista conta hoje.
Via internet
Sentado de frente a um computador, o relações públicas Júlio Cardia (foto), 28 anos, recebeu por e-mail um convite para integrar a rede social Orkut. Abriu a página e começou a preencher os espaços em branco requeridos para sua inscrição no site. Carregou uma foto sua, colocou nome, idade, cidade onde morava. Na vez da pergunta “opção sexual”, Júlio sentiu um calor no rosto. Sem titubear, disse pela primeira vez ao mundo que era gay. Mal sua página entrou no ar e os amigos, chocados com a revelação virtual, começaram a ligar. Nada foi planejado. Mas, naquele momento, olhando para a tela do computador, Júlio optou por não mentir mais. Sua vida mudou a partir dali.
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