11 de maio de 2011

Vida de Armário

De todas as consequências da vida no armário, nada é tão devastador quanto a necessidade de mentir. Fingir ser o que não se é, aprender a educar gestos e olhares, mentir para amigos, criar histórias, esconder sentimentos, anseios e dúvidas. Vestir sempre, a cada dia, uma máscara de algo que não se é e nem se sente.

Para alguns a vida no armário é a única alternativa de sobrevivência. Sabem, no mais íntimo, que quebrar aquela porta, significa romper com todos as amarras que o deixam seguro: serão excluídos da família, perderão emprego, amigos. E então eles aprendem a fingir. Aprendem a rir das piadas homofóbicas, a esconder os olhares de interesse, negar a atração por aquele amigo da sua irmã, conter-se, mesmo bêbado, para não "dar pinta". Aprendem a ter sempre uma história de reserva, para justificar sua presença naquele lugar de pegação. Aprendem a virar o rosto na rua, ao encontrar aquela transa da última noite. Se lembram de não estar tão perto dos outros para que ninguém perceba a verdade.

Mentem tanto e tão frequentemente que um dia se percebem presas daquela história que criaram. Automatizam gestos, risos, olhares e toques. Vivem num estado permanente de tensão. E não conseguem estabelecer vínculos duradouros nem de amizade nem de amor, por que onde nasce a mentira não se cria laços. Eles podem até amar, mas sempre fica a dúvida se são amados pelo que são ou pelo que dizem ser.

Não é fácil sair do armário. Nem é um movimento que se possa fazer pelo outro. E não acontece de uma hora para outra, apenas pelo desejo. Atitudes internalizadas, anos de negação, o medo da reação das pessoas e as próprias inseguranças não desaparecem só por que se disse "sou gay". Não se dorme no armário, agindo como hétero e fingindo 24h por dia e se acorda sem medo de andar de mãos dadas ou beijar em público. As armaduras usadas não vão desaparecer como mágica. 

Eu não acredito que existam fórmulas. E não acho que alguém tenha o direito de dizer quando, como ou para quem você precisa dizer que é gay. O que eu sei é que o armário tem consequências devastadoras. Ninguém consegue ser feliz de VERDADE, vivendo uma MENTIRA eterna. As consequências dessa escolha, só você pode decidir se está disposto a pagar.


"A vida no armário destrói a pessoa. Você aprende a mentir como uma segunda natureza. O seu primeiro movimento é mentir. Para você, para sua família, para os amigos, para o chefe no trabalho, para a namorada. E uma hora você mentiu tanto, que já nem sabe onde está a verdade. Você já não pensa para tomar algumas atitudes, mas elas estão tão internalizadas que você faz sem perceber. E se magoa e magoa aos outros. Num ciclo sem fim de dor"

Lilah Bianchi, carioca, 43 anos, atualmente perdida na Bolívia. Mãe do Lipe, do Victor, do Lucas e do Saulo. Professora Universitária e escritora amadora. Que viu o mundo tomar uma virada quando ouviu um deles dizer: Mãe, sou Gay!

Um comentário:

  1. Linda história. E mais tocante ainda quando você a viveu parte de sua vida.

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